Pão doce e manteiga: inimigos mortais
Pão doce e manteiga: inimigos mortais
As cidades do interior são repletas de figuras emblemáticas e muito engraçadas. Entram para o folclore da cidade e são conhecidas e lembradas durante muito tempo.
No norte de Minas, existem muitas cidades com personagens marcantes, engraçados, e por isso mesmo, conhecidos em toda a cidade e mesmo nas vizinhanças. Alguns até extrapolam os limites regionais.
Numa pequena cidade daquele sertão mineiro, havia uma padaria muito conhecida, não só pelas iguarias feitas e vendidas pelo proprietário, mas pelo próprio, uma figura famosa pelo jeito diferente e com suas manias muito peculiares.
Uma delas era referente a um pão doce, vendido há muito tempo na padaria. Era muito bom e por isso mesmo muito procurado pelos fregueses, seja para levar ou acompanhar o café da manhã, saboreado na própria padaria.
Certo dia passou por lá um viajante, vindo de Montes Claros e percorrendo várias cidades da região, vendendo cortes de tecido, roupas femininas e perfumes de origem duvidosa.
Chegando na cidade logo de manhãzinha, foi até a padaria para conhecer e experimentar o pão doce sobre o qual seus amigos lhe falavam. Chegou e procurou pelo proprietário:
- Bom dia, "Seu" Chiquito!
- Bom dia.
- O senhor me traz por favor um pão doce?
- Pois não, meu amigo. Saído agorinha do forno.
- E traz também um pouco de manteiga.
- O que??? O senhor vai passar manteiga no meu pão doce?
- Vou sim. Gosto do pão doce com manteiga.
- Mas não o meu pão doce!
- Uai, por que? Sempre comi pão doce com manteiga.
- Mas o meu, o senhor não vai comer com manteiga.
- Mas eu tô pagando e quero a manteiga pra passar no pão.
- Pois então o senhor pode me devolver o pão, mas passar manteiga nele não vai não!
- Não vou devolver nada. Então me dá mais três pães, embrulha que eu vou levar.
O Seu Chiquito, muito a contragosto, meio desconfiado, apanhou os quatro pães, embrulhou e entregou ao viajante, que pagou e saiu da padaria intrigado com o sistema do Seu Chiquito. Ao sair, ainda balbuciou:
- Êta povo cheio de mania, sô! Mas isso não vai ficar assim não.
Andou até a praça onde alguns meninos brincavam de bolinha de gude. Chegou perto de um deles e perguntou:
- Como é seu nome, menino?
- Bilota.
-Bilota?
- O nome mesmo é Joaquim, mas todo mundo aqui me chama de Bilota.
- Você sabe onde é a padaria do Seu Chiquito?
- Sei, sim Senhor, por que?
- Vou te dar um trocado para você ir lá comprar uma coisa pra mim, ok?
- Claro. O que é que eu vou comprar?
- Quero que você vá lá e compre 100 gramas de manteiga pra mim.
- Tá bom.
- Mas não demora que eu vou ficar aqui esperando.
Entregou o dinheiro ao garoto que saiu correndo na direção da padaria, pensando na gorjeta que o moço tinha prometido. O garoto chegou na padaria e pediu ao Seu Chiquito:
- Moço, me arranja 100g de manteiga, por favor.
- Seu Chiquito, muito acostumado com seus fregueses, estranhou aquilo. Reconheceu o garoto e desconfiou, pois aquela compra não era comum para um menino daquela idade.
- Você não é o Bilota, filho do Zé da Chita e dona Gracinha?
- Sou sim.
- Pois é. Eu conheço você, seu pai e sua mãe. Eles não iam dar dinheiro pra você comprar manteiga não. Você deve estar comprando é praquele viajante fiduma égua. Não vou vender não! Você volta lá e diga pra ele que no meu pão doce ele não vai passar manteiga não.
Bilota, sem ter como argumentar, voltou triste para a praça, pois perderia sua gorjeta.
- Moço, toma seu dinheiro. Seu Chiquito disse que é pro senhor procurar outra padaria, que no pão doce dele o senhor não vai passar manteiga.
O viajante, injuriado com Seu Chiquito, desabafou:
- É... tem jeito não!
Entrou no carro e continuou sua viagem para tentar na cidade mais próxima. Talvez lá a manteiga e o pão doce não sejam inimigos mortais. Ou o padeiro seja mais normal!
* Antônio Marcos Ferreira
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