O exemplo muitas vezes vem de onde nunca imaginamos
O exemplo muitas vezes vem de onde nunca imaginamos
A gente às vezes se habitua a perceber valores e qualidades apenas nas pessoas estudadas, ou naquelas que ocupam posições de destaque na sociedade.
E na verdade esta é uma percepção distorcida e que nos leva a conclusões muitas vezes equivocadas. Ou nos leva a não dar o devido valor a pessoas que não se enquadram naquele perfil imaginado para as "pessoas do bem".
Sou voluntário numa entidade que acolhe crianças e adolescentes com câncer, a Fundação Sara, fundada há 25 anos em Montes Claros e há 13 anos com uma unidade em Belo Horizonte.
Em 2011 chegou à Fundação um garoto de treze anos, com diagnóstico de meduloblastoma, um tumor maligno no cérebro.
Oriundo da região rural de Araçuai, chegou acompanhado do seu pai, um senhor já com pouco mais de sessenta anos, com condição financeira bem difícil.
O cuidado e a atenção dele para com o filho chamavam a atenção de todos, já que na maioria dos casos é a mãe quem acompanha o filho nessas situações.
O tratamento do garoto seguiu todos os protocolos e depois de um bom tempo na Fundação e de várias internações hospitalares, eles receberam alta para retornar para sua terra.
Um momento de muita alegria sempre. E com eles não foi diferente. Retornaram para Araçuaí para uma nova vida, agora livre do câncer.
Durante muito tempo não tivemos mais notícias deles. Até que há três meses, ao chegar na Fundação, vi aquele garoto de outrora, agora um rapaz de 25 anos. Ao vê-lo, verifiquei que o seu aspecto denunciava que algo não estava bem.
E realmente não estava. A doença, que há mais de dez anos havia sido debelada, estava de volta e pedia novos cuidados.
E junto com aquele rapaz novamente me encontrei com o seu acompanhante, aquele senhor, agora já com 76 anos. E o mesmo semblante sereno. Ao me ver, sorriu, e me cumprimentou:
- Oi, seu Antônio, tudo bem com o senhor?
-Tudo bem, e com o senhor? Não deve estar bem, não é? Vocês de volta aqui depois de tanto tempo, não deve ser coisa boa!
-Pois é. Estamos de volta pois o tumor voltou.
Aproveitei para conversar um pouco com ele, coisa que quase não tinha feito na primeira internação do filho. E a conversa me trouxe revelações que fizeram crescer ainda mais a minha admiração por ele.
Antes ficara sabendo que aquele rapaz na verdade era filho adotivo. Admirado, perguntei:
- Ele é filho único?
- Não, tenho mais outros seis filhos.
- Mas este rapaz é seu filho adotivo, não é?
- Sim. E os outros seis também. Tenho sete filhos adotivos. E todos de mães diferentes!
Não conseguia acreditar no que ouvira!
Como era possível que alguém sem condição financeira, sem instrução, se dispõe a adotar sete crianças de mães diferentes, com todas as dificuldades e problemas que essa decisão poderia trazer para sua vida? E ele encara com a maior serenidade, e fala como se fosse a coisa mais natural do mundo.
Saí da Fundação com aquela história bombardeando a minha mente, como se Deus quizesse me ensinar o sentido da doação, da entrega, do desprendimento e do amor.
Tomara que aquele exemplo reforce em meu coração esses valores para que minhas próximas atitudes sejam sempre baseadas neles.
Que Deus me ajude!
* Antônio Marcos Ferreira