Por que nossos artistas saem do Brasil?
Por que nossos artistas saem do Brasil?
Vivemos numa sociedade dinâmica. As interações sociais, os costumes, a política e a cultura se transformam constantemente. Entre as mudanças que observamos está a do universo musical.
Há uma análise deste mercado que tem sobrevivido. A partir da ideia de "indústria cultural", pensa-se numa certa hegemonia do mercado fonográfico. Os donos deste mercado produziriam músicas descartáveis e em grande volume para o consumo imediato. A falta de um julgamento refinado junto com o desejo pelo lucro seria o círculo vicioso que tem feito a qualidade musical decair no mundo globalizado e industrializado. Desta análise crítica, pode-se extrair algo interessante. O avanço da técnica fez com que o poder dos donos deste mercado fosse dissolvido.
Os artistas, hoje, tem mais acesso a equipamentos e conhecimentos, alavancados pela rede mundial de computadores. Com isto, torna-se possível produzir arte fora dos antigos meios e processos das grandes empresas. Não é a toa que grandes gravadoras tem se levantado contra a internet. Para além do discurso, é preciso compreender um pouco o artista atual, especialmente o artista desconhecido das massas, e seus desafios diante deste mercado tão dinâmico. Ao falar de mercado, pensa-se rapidamente nos EUA como um local de concorrência e livre mercado.
Mas se as distâncias e fronteiras tem diminuído, por que artistas brasileiros tem deixado o país? Para Jopa Velozo, 28 anos, guitarrista, um dos motivos é "que a estrutura das escolas de música nos EUA é muito superior ao de qualquer faculdade de música no Brasil". O intercâmbio com musicistas do mundo inteiro também tornam o ambiente mais estimulador. Numa faculdade como a de Berklee, em Boston, há mais de 3 mil músicos. A cidade ainda possui outras boas escolas de música como a New England Conservatory e a Boston Conservatory.
Além da estrutura dos cursos, há um ambiente econômico que favorece o músico nos EUA. "No Brasil, além de ganharmos menos, tudo é muito mais caro. O músico que vem de uma família pobre brasileira sofre muito para ter um instrumento apenas razoável. Ter algo de ponta é quase impossível. Aqui, isso tudo é acessível a todos. Você não vê americano chegar na faculdade com instrumento mais ou menos. Produzir, gravar, tudo é mais acessível." No Brasil, o Projeto de Lei do Senado nº 86 de 2004, teve sua apreciação adiada no dia 15 de julho de 2014.
São mais de dez anos de discussão acerca da isenção de impostos sobre instrumentos musicais importados. Ao invés de facilitar a aquisição de instrumentos, que possuem cerca de 40% de impostos, o governo brasileiro tem usado o modelo de incentivos fiscais a projetos aprovados pela Lei Rouanet. Grandes artistas e institutos artísticos bem relacionados têm conseguido apoio e são poucos os projetos pequenos e independentes que recebem verba.
Tal modelo dificulta a entrada de novos nomes no mundo artístico, fomentando uma manutenção de artistas já consagrados. Não podemos desconsiderar outro fato importante. Nos EUA, por exemplo, as pessoas estão dispostas a financiar o que gostam. Um produto só permanece sendo ofertado se houver demanda. Enquanto os consumidores brasileiros de músicas não populares não investirem no que desejam ouvir, ficarão reféns do que as massas tem consumido. Obviamente que nem tudo são flores. Muitas vantagens de sair do Brasil podem ser apenas ilusórias.
"Num mercado tão competitivo quanto o da música, é normal entender que para conseguir algo não basta apenas ser bom", comenta Velozo. Entretanto, nos EUA, além de "existir mais segurança e tudo ser mais acessível a todos, pode-se viver uma vida num padrão bastante superior ao do Brasil." Com as facilidades em Boston, Jopa, conhecido pelo projeto Acadêmicos de Milton Friedman, que mistura bossa nova com samba, também toca na banda de rock The Plan of the Plain. Enquanto músicos brasileiros constroem suas carreiras no exterior, o mercado brasileiro, ainda com vencedores previamente definidos, fecha as portas para muitos projetos musicais.
*Filipe Rangel Celeti é Bacharel e licenciado em Filosofia pela Universidade Presbiteriana Mackenzie e Mestre em Educação, Arte e História da Cultura pela mesma instituição.