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Renúncia já?

Renúncia já?

22/04/2015 Waldemar Mariz de Oliveira Neto e Maria Valéria Mielotti Carafizi

Perceba-se que a punição prevista, é a perda do cargo e não do mandato.

As recentes manchetes dos jornais dão conta da encomenda pelos partidos de oposição de parecer quanto à possibilidade de impeachment da Presidente Dilma.

Entre os juristas citados, encontra-se o emérito Professor Miguel Reale Jr. que, recentemente, já manifestou sua opinião quanto ao não cabimento de impeachment contra atos realizados no primeiro mandato da Presidente. Não se pretende aqui discutir se Dilma é culpada, ou mesmo se é possível enquadrá-la numa das 65 condutas descritas na lei do impeachment, em verdade, quer-se estudar a possibilidade da perda do cargo por atos ocorridos em seu mandato anterior.

A lei 1.079 de 1950 descreve em seu segundo artigo, abaixo transcrito, que os crimes ali previstos são penalizados com a perda do cargo e com a inabilitação por cinco anos para o exercício de qualquer função pública. “Art. 2º Os crimes definidos nesta lei, ainda quando simplesmente tentados, são passíveis da pena de perda do cargo, com inabilitação, até cinco anos, para o exercício de qualquer função pública, imposta pelo Senado Federal nos processos contra o Presidente da República ou Ministros de Estado, contra os Ministros do Supremo Tribunal Federal ou contra o Procurador Geral da República.”

Perceba-se que a punição prevista, é a perda do cargo e não do mandato. Adicionalmente o artigo 15 da mesma lei, prevê que a denúncia que inicia o processo de impeachment pode ser recebida, contanto que o denunciado, não tenha deixado em definitivo o cargo.

“Art. 15. A denúncia só poderá ser recebida enquanto o denunciado não tiver, por qualquer motivo, deixado definitivamente o cargo.” Note-se que a lei não cita a palavra mandato em momento algum, exceto ao tipificar, no item 2 do artigo 6º, um dos crimes passíveis de processo de impeachment, quando há o emprego de violência ou ameaça de modo a coagir algum representante da nação no modo de exercer seu mandato. Portanto, a ausência da palavra mandato, torna necessário diferenciar o que é cargo do que é mandato.

Utilizando-se de uma comparação bastante simplista, o cargo é uma cadeira onde, por exemplo, senta-se o Presidente da República, que adquiriu o direito de lá estar, porque, recebeu um mandato (procuração), outorgado pelo povo, que o autoriza a exercer as funções daquele cargo, isto é, o cargo é exercido através do mandato. A escolha de quem receberá essa autorização dá-se, democraticamente, por maioria de votos através de eleição, portanto, em um próximo pleito, quer haja a reeleição ou a eleição de um novo representante do povo, um novo mandato será outorgado para que o eleito assuma aquele mesmo cargo, ou seja, venha a sentar-se na mesma cadeira.

Assim, o cargo de presidente é um só e jamais deixa de existir apenas porque o mandato foi renovado através da reeleição, ou porque um novo eleito o assumiu. Tanto é assim que a própria Constituição Federal define a função de Presidente da República como um dos cargos que somente os brasileiros natos podem exercer, conforme consta do § 3º do artigo 12:

“§ 3º - São privativos de brasileiro nato os cargos:
I - de Presidente e Vice-Presidente da República;
II - de Presidente da Câmara dos Deputados;
III - de Presidente do Senado Federal;
IV - de Ministro do Supremo Tribunal Federal;
V - da carreira diplomática;
VI - de oficial das Forças Armadas.”

E mais, segue a Constituição ainda definindo cargos, quando, no § 6º do artigo 14 que prevê:

“§ 6º - Para concorrerem a outros cargos, o Presidente da República, os Governadores de Estado e do Distrito Federal e os Prefeitos devem renunciar aos respectivos mandatos até seis meses antes do pleito.”

Logo, da previsão mencionada conclui-se que a renúncia do mandato para um novo pleito, causa a perda da eficácia da procuração outorgada pelo povo com a consequente perda do cargo, pois, sem mandato não se pode exercê-lo, caso em que então assume o vice. Tal conclusão justifica, portanto, o que viu-se na prática das últimas eleições, como a então presidente concorreria a um novo mandato para o mesmo cargo, desnecessário foi seu afastamento.

Portanto, como aqui colocado, mandato e cargo são conceitos jurídicos diferentes, e todas as previsões constantes da lei de impeachment visam, como punição aos crimes lá definidos, a perda do cargo e não do mandato. Sanadas as questões relativas aos conceitos mencionados, importante ainda salientar que o artigo 15 da lei de impeachment prevê, como condição para a realização do processo de julgamento, que o denunciado não tenha, por qualquer motivo, deixado definitivamente seu cargo, ou seja, a lei determina que não se inicie um processo de impeachment contra quem não exerça mais a função, neste caso, o Presidente que em tendo deixado o cargo, em caráter definitivo e não provisório, quer seja por renúncia, ou por ter assumido outro cargo, ou por quaisquer outros motivos.

Portanto, o reeleito, por mais que tenha recebido um novo mandato, não deixou o cargo em definitivo, poder-se-ia admitir, na mais benévola das interpretações, que houve uma vacância temporária entre o fim do dia 31 de dezembro e o momento de empossamento do novo mandato, pela manhã do dia 01 de janeiro.

Poder-se-ia também argumentar que o impeachment seria ato de revogação do mandato realizado em nome do povo por seus representantes eleitos, porém tal afirmação não prospera, já que o processo de impeachment não depende da vontade popular; sendo sim processo de natureza criminal vinculado, portanto, ao enquadramento em um dos 65 crimes tipificados na lei ordinária e que possui como pena, além da inabilitação por 05 anos, a perda do cargo.

Não se trata, por todo o exposto, de interpretação menos favorável ao réu, o que decerto feriria os princípios basilares do Direito Penal, trata-se apenas da leitura ipsis litteris da norma. Assim, pouco implica em qual dos mandatos/procurações teriam sido praticados os crimes, se no primeiro governo ou do atual, importa, em verdade, que o cargo jamais foi deixado em caráter definitivo, portanto, cabível a denúncia por atos praticados no decorrer de qualquer dos exercícios. Depois de ler este artigo, você ainda acredita que estaria mesmo o povo brasileiro à mercê de um ato de vontade da presidente da república?

*Waldemar Mariz de Oliveira Neto e Maria Valéria Mielotti Carafizi, sócios da Mariz de Oliveira & Mielotti Carafizi Sociedade de Advogados.



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