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Correios em crise: o retrato da ineficiência e do uso político das estatais brasileiras

Correios em crise: o retrato da ineficiência e do uso político das estatais brasileiras

28/10/2025 André Charone

Durante décadas, os Correios foram símbolo de confiança. A empresa pública entregava cartas, encomendas e resultados, financeiros, inclusive.

Em 2020 e 2021, em plena pandemia, a estatal chegou a registrar lucros expressivos, impulsionada pelo boom do e-commerce e por um plano de reestruturação que, pela primeira vez em anos, parecia colocar a casa em ordem.

Mas bastaram poucas trocas de comando e uma guinada de orientação política para que o cenário se invertesse. O que era lucro virou rombo bilionário.

O que era eficiência virou aparelho político. E o que era promessa de modernização virou laboratório de improvisos estatais.

Do lucro ao buraco: uma linha do tempo que explica tudo

Em 2020, os Correios fecharam o ano com lucro líquido de R$ 1,53 bilhão, o melhor resultado em quase uma década.

Em 2021, mantiveram o fôlego, com lucro de R$ 3,7 bilhões, resultado de medidas de austeridade, corte de custos, digitalização de serviços e ganhos com o mercado de encomendas, impulsionado pelas compras online em plena pandemia.

Foi um momento raro em que a empresa parecia ter encontrado um rumo: um modelo enxuto, com foco comercial, governança corporativa mais rígida e discurso de eficiência. Havia, inclusive, debate sobre possível privatização, o que pressionou a estatal a mostrar resultados concretos.

Mas o bom momento durou pouco. A partir de 2022, já sob nova direção e um contexto político diferente, os números começaram a despencar:

- 2022: prejuízo de R$ 808,8 milhões;
- 2023: prejuízo de R$ 633,5 milhões;
- 2024: prejuízo de R$ 2,59 bilhões;

1º semestre de 2025: prejuízo acumulado de R$ 4,3 bilhões, superando todo o ano anterior.

Ou seja, em menos de três anos, a estatal saiu de um ciclo de lucros recordes para um abismo financeiro que ameaça sua própria sobrevivência.

O que piorou desde então

1. Interferência política e aparelhamento

A governança que existia foi desmontada. Cargos técnicos foram substituídos por indicações políticas, com diretores escolhidos mais por vínculos partidários do que por experiência em logística ou gestão empresarial. A lógica empresarial deu lugar à lógica do “quem indica”.

2. Reversão de medidas de eficiência

A estatal abandonou parte das reformas administrativas implementadas entre 2019 e 2021, inclusive cortes de contratos e redução de gastos de custeio. Os custos operacionais voltaram a crescer, e a produtividade por funcionário caiu.

3. Impactos de políticas tributárias e comerciais equivocadas

A “Taxa das Blusinhas”, criada para tributar pequenas remessas internacionais, reduziu drasticamente o volume de importações processadas pelos Correios.

O que o governo vendeu como “proteção da indústria nacional” se transformou em um golpe na principal fonte de receita da estatal.

4. Paralisia estratégica

Enquanto concorrentes privados investem em automação, inteligência artificial e rastreamento em tempo real, os Correios continuam com sistemas obsoletos e processos manuais. O resultado é previsível: atrasos, extravios e perda de mercado.

5. Explosão de custos fixos e passivos trabalhistas

A empresa carrega uma estrutura pesada: 6 mil agências próprias, muitas deficitárias, e obrigações trabalhistas gigantescas.

O balanço de 2024 mostra R$ 18,9 bilhões em receita líquida, mas R$ 4,7 bilhões apenas em despesas administrativas.

As provisões contábeis de planos de aposentadoria e benefícios pós-emprego (CPC 33) continuam corroendo o resultado.

O uso político das estatais: a velha história reeditada

Nenhuma empresa sobrevive quando é tratada como ferramenta partidária. E é exatamente isso que acontece com os Correios.

A cada troca de governo, muda o discurso, mas o roteiro é o mesmo: cargos loteados, decisões lentas e promessas vazias.

A interferência política é tão intensa que o Tribunal de Contas da União alertou para o “risco de insustentabilidade” da estatal.

E, para remediar o caos, o governo federal já prepara um empréstimo de R$ 20 bilhões com garantia da União, em outras palavras, o contribuinte novamente vai pagar a conta da má gestão.

O atraso nas entregas e na gestão

Ironia das ironias: os Correios conseguiram ser lucrativos sob um modelo de austeridade e controle, e voltaram ao prejuízo justamente quando se prometeram “humanizar” a gestão e “fortalecer o papel social” da empresa. O resultado desse “novo modelo” é o de sempre: rombos, promessas e pacotes que não chegam.

Enquanto o país discute “governança pública”, a estatal segue operando como uma repartição anacrônica: departamentos ineficientes, sistemas travados e uma comunicação que parece escrita por estagiários de 1995. O que deveria ser orgulho nacional virou uma caricatura de burocracia.

Os Correios são o retrato de um país que se recusa a aprender com os próprios erros. Já provaram que podem ser eficientes quando geridos com técnica e responsabilidade.

Mas, enquanto continuarem servindo de instrumento político, continuarão entregando, com atraso, apenas prejuízos.

* André Charone é contador, professor universitário, Mestre em Negócios Internacionais pela Must University (Flórida-EUA).

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