Portal O Debate
Grupo WhatsApp

Depois da festa e do choro, vamos cair no real

Depois da festa e do choro, vamos cair no real

09/10/2009 Fábio P. Doyle

Foi ótimo. O Rio ganhou e a América do Sul vai ter sua primeira olimpíada. Mas temos dinheiro para bancar os gastos? Temos atletas para conquistar medalhas como os chineses em Pequim? E temos fiscais para controlar o emprego das verbas? E se Chicago tivesse sido a escolhida, Obama derramaria torrentes de lágrimas?

O RIO ganhou! O Brasil vai sediar as Olimpíadas de 2016. A comitiva oficial que foi à Dinamarca, para acompanhar a dsecisão do Comité Olímpico, festejou, o Brasil todo comemorou a escolha. Afinal, concorríamos com Chicago, com Tóquio, com Madri. Concorríamos com o presidente Obama e sua Michelle, concorríamos com o Rei Juan Carlos e seu primeiro ministro Zapatero, concorríamos com os sizudos japoneses. E vencemos. E agora, José?

AGORA é enfrentar as agruras e as despesas da preparação. Temos atletas que possam repetir o feito dos chineses, que conquistaram a maioria das medalhas nas Olimpíadas de Pequim? Temos verbas, temos dinheiro para bancar a preparação, o treinamento dos jogadores, as obras de estrutura e infraestrutura, de melhorias urbanas que o Rio precisa?

DIZ o presidente Lula que temos. Olimpíada, especialmente se realizada no Brasil, tem que ter patrocínio do governo. Se não, fica apenas no papel. Parcerias privadas podem ser obtidas. Mas em volume insuficiente. E empresário, diante do gasto previsto, algo em torno de 30 bilhões de reais, só pensa no que ele pode ganhar. Especialmente, os menos escrupulosos, através de superfaturamentos, de propinas, de comissões, de desvios de verbas para paraísos fiscais.

UMA beleza, o Rio, minha terra também por amor pessoal e por direito de família. E o vejo, graças à Olimpíada, remodelando-se, aprimorando-se, ganhando novas linhas de metrô, novo sistema de canalização de água e de esgotos, de despoluição da Lagoa Rodrigo de Freitas, da baía de Guanabara, duplicação do número de hotéis, de restaurantes, de policiais na área da segurança. Até com desfavelização dos morros cariocas, conforme promessa de Lula, o presidente que mais chorou na história do mundo, diante de milhares de câmeras de televisão, ao ser anunciada a escolha do Rio.

TUDO bem, vamos comemorar, mas sem chorar tanto. Pois o caso é de alegria. Mas vamos pensar no outro lado da moeda fraca. Vamos cair na real e no real. Se temos verba suficiente para pagar as contas, como Lula diz, por que não temos verba para erradicar a miséria, para dar assistência médica e hospitalar a todos os brasileiros, especialmente os mais pobres, por que não temos salas de aula para todas as crianças, por que pagamos tão mal aos professores, aos policiais, aos médicos, aos enfermeiros, aos aposentados? Sempre que se fala em resolver qualquer um dos problemas mencionados, a resposta dos ministros e de Lula é a mesma: não temos verba, o Brasil pode quebrar, precisamos criar mais impostos, e por aí.

SERÁ criado um imposto novo para cobrir as despesas com as Olimpíadas? É o que faltava… Se não for através de novos tributos, de onde sairá o misterioso dinheiro que falta para tudo mais? E se o dinheiro sair, como deverá sair, quem irá fiscalizar a sua aplicação correta, sem desvios, sem comissões, sem sobrepreços, sem propinas? Estou sendo injusto, pessimista? Não. Apenas fundado na realidade. O Rio sediou os jogos Pan-Americanos. O que aconteceu com as verbas destinadas aos jogos? Perguntem, ao Tribunal de Contas da União, que até hoje não aprovou as prestações de contas que lhe foram encaminhadas, exatamente por estarem coalhadas de irregularidades. Para Olimpíada, o dinheiro é muito maior, as verbas bem mais generosas. Como assegurar lisura total, ou pelo menos, parcial, pois total é inalcançável?

DIFÍCIL. No Brasil quase nada é feito com correção. Alguém duvida do vazamento de questões a que são submetidos os candidatos a concursos públicos? O exemplo do ENEM é de ontem. As provas que os mais de quatro milhões de alunos deveriam responder foram oferecidas, dois dias antes de sua realização, a jornalistas de "O Estado de S. Paulo", por R$ 500 mil (os jornalistas rejeitaram a proposta e denunciaram a fraude). Tem jeito?

É UMA vitória brasileira, a escolha do Rio. Mas é, também, uma vitória sul-americana. A razão principal para que o Rio fosse escolhido, segundo declarações dos próprios jurados do Comitê Organizador, foi a da localização geográfica. Nunca antes a América do Sul havia sediado uma Olimpíada. A Europa, a América do Norte, a Ásia, várias vezes. Um dos jurados comentou que o Rio, pela sua beleza, foi um dos motivos da escolha, mas o básico, foi estar na América do Sul. Se Buenos Aires, ou Santiago do Chile, ou Montevidéu, estivessem na lista no lugar do Rio, certamente teriam também vencido.

DIANTE da minha TV, acompanhando a votação e o anúncio final da cidade vitoriosa, surpreendi-me com o choro convulsivo de nosso presidente boa praça. Que mostrou sua sensibilidade. Mas, permito-me, acho que chorou demais, soluçou em demasia. Especialmente para quem ocupa um posto tão elevado e diante do mundo. E fiquei a pensar, como diria um lisboeta, se Chicago tivesse sido a escolhida. Barack Obama se derramaria nas lágrimas incontroláveis da emoção? E se fosse Madri, ou Tóquio, a vitoriosa? O rei Juan Carlos molharia suas novas barbas nas lágrimas, o sisudo japonês seria obrigado a usar o lenço branco para enxugar os olhos apertados e molhados? Na minha cogitação preguiçosa, lembrei-me de Fernando Henrique, de Itamar Franco, ex-presidentes. Imaginei os dois chorando, soluçando, a voz embargada na leitura do discurso preparado pela assessoria. Não, a cena é inimaginável.

MAS, tudo terminado, valeu. Cuide-se, agora, das verbas, dos gastos. Só a numerosa comitiva que foi a Copenhague, custou ao Brasil, entre gastos de passagens, hotéis e diárias, R$ 354.674,56, segundo os dados disponíveis. As diárias para os assessores giraram entre 150 a 350 euros (R$ 390 a 910 reais). Valeu? Acho que sim. Mas o pior será a partir de agora. Afinal, o gasto previsto, de R$ 30 bilhões, se acompanhar o que aconteceu no Pan-Americano, pode ser triplicado. E haja Tribunal de Contas para aprovar tudo.

POR sorte minha, estava em Atlanta, com minha família, no ano das Olimpíadas de 1996, e em Roma, quando das Olimpíadas de 1960. Atlanta no clima contido e perfeccionista bem norte-americano, o que não impediu, como havia acontecido em Munich, na Alemanha, em 1972, que uma bomba explodisse em um parque da cidade, matando duas pessoas e deixando 100 feridas. Roma, para mim uma das cidades mais bonitas e agradáveis do mundo, ainda no rescaldo das obras para sediar os jogos, sem bombas para atrapalhar. O povo estava em festa, aliás, como sempre os romanos estão. Mas sem exageros carnavalescos e praianos. Espero participar, como espectador, das Olimpíadas de 2016, do Rio. Afinal, tudo será pago com o nosso suado dinheirinho, arrecadado com voracidade tributária cada vez maior. Se lá chegar, estarei torcendo pelas nossas equipes e para que o já citado dinheirinho suado seja bem e honestamente empregado. Sonhar, meus amigos, não paga nada.

Fábio P. Doyle, Jornalista e Membro da Academia Mineira de Letras. Visite o Blog.

 



2024, um ano de frustração anunciada

O povo brasileiro é otimista por natureza.

Autor: Samuel Hanan


Há algo de muito errado nas finanças do Governo Federal

O Brasil atingiu, segundo os jornais da semana passada, cifra superior a um trilhão de reais da dívida pública (R$ 1.000.000.000.000,00).

Autor: Ives Gandra da Silva Martins


O mal-estar da favelização

Ao olharmos a linha histórica das favelas no Brasil, uma série de fatores raciais, econômicos e sociais deve ser analisada.

Autor: Marcelo Barbosa


Teatro de Fantoches

E se alguém te dissesse que tudo aquilo em que você acredita não passa de uma mentira que te gravaram na cabeça? E que o método de gravação é a criação permanente de imagens e de histórias fantásticas?

Autor: Marco Antonio Spinelli


Esquerda ou direita?

O ano de 2020 passou, mas deixou fortes marcas no viver dos seres humanos.

Autor: Benedicto Ismael Camargo Dutra


O investimento público brasileiro e a estruturação social inclusiva

O investimento público desempenha um papel crucial no desenvolvimento de uma nação.

Autor: André Naves


Eleições 2024: o que vem pela frente

Em outubro de 2024, os brasileiros retornarão às urnas, desta vez para eleger prefeito, vice-prefeito e vereadores de seus municípios.

Autor: Wilson Pedroso


Seja um líder que sabe escutar

Uma questão que vejo em muitas empresas e que os líderes não se atentam é sobre a importância de saber escutar seus colaboradores.

Autor: Leonardo Chucrute


Refugiados, ontem e hoje

A palavra “refugiados” vem da palavra fugir.

Autor: Solly Andy Segenreich


A solidão do outro lado do mundo

Quem já morou no exterior sabe que a vida lá fora tem seus desafios.

Autor: João Filipe da Mata


Um lamento pelo empobrecimento da ética política

Os recentes embates, físicos e verbais, entre parlamentares nas dependências da Câmara Federal nos mostram muito sobre o que a política não deve ser.

Autor: Wilson Pedroso


Governar com economia e sem aumentar impostos

Depois de alguns tiros no pé, como as duas Medidas Provisórias que o presidente editou com o objetivo de revogar ou inviabilizar leis aprovadas pelo Congresso Nacional - que foram devolvidas sem tramitação - o governo admite promover o enxugamento de gastos.

Autor: Tenente Dirceu Cardoso Gonçalves