Grupo WhatsApp

Presunção de culpa em cirurgias plásticas

Presunção de culpa em cirurgias plásticas

20/03/2025 Natália Soriani

O Superior Tribunal de Justiça (STJ) proferiu, recentemente, uma decisão de grande impacto que redefine substancialmente o entendimento jurídico acerca da responsabilidade médica em cirurgias plásticas puramente estéticas.

A decisão estabelece a presunção de culpa do cirurgião plástico quando o resultado de uma cirurgia não for considerado harmonioso, mesmo que o profissional tenha seguido rigorosamente todos os protocolos e utilizado as melhores técnicas disponíveis.

Esta jurisprudência contrasta com a interpretação tradicional do Conselho Federal de Medicina (CFM) e da Sociedade Brasileira de Cirurgia Plástica (SBCP), que defendem uma avaliação de responsabilidade baseada na execução correta das técnicas e dos métodos disponíveis, caracterizando a obrigação do médico como uma "obrigação de meio".

Tradicionalmente, a responsabilidade dos médicos, na maioria dos casos, é entendida como uma obrigação de meio, o que significa que o profissional tem o dever de empregar os melhores meios disponíveis para alcançar um resultado, sem, contudo, garantir um resultado específico.

Isso implica que o médico deve seguir os protocolos estabelecidos, utilizar as técnicas adequadas e agir com diligência e perícia.

No entanto, o novo entendimento do STJ aplica uma lógica diferente às cirurgias plásticas estéticas, categorizando-as como obrigações de resultado

Isso significa que, caso o resultado não atenda às expectativas estéticas do paciente ou ao senso comum de harmonia estética, o cirurgião pode ser responsabilizado judicialmente, mesmo que não tenha havido negligência, imprudência ou imperícia em sua atuação.

Por exemplo, em um caso de rinoplastia, onde o paciente alega que o formato do nariz após a cirurgia não está em harmonia com o restante do rosto, a presunção de culpa recairia sobre o cirurgião, mesmo que este possa demonstrar que seguiu todos os procedimentos técnicos corretos e que não houve complicações durante a cirurgia.

A decisão do STJ provoca um debate acalorado no cenário médico e jurídico, gerando preocupações e questionamentos sobre seus efeitos práticos.

É preciso observar que este novo entendimento pode causar uma insegurança jurídica aos cirurgiões plásticos, uma vez que os submete a uma responsabilidade objetiva, independentemente de sua atuação técnica.

Tal regime jurídico poderia levar a um aumento nos custos dos seguros de responsabilidade civil para esses profissionais e potencialmente desestimular a prática da cirurgia estética, especialmente para procedimentos mais complexos ou em pacientes com expectativas irrealistas.

Além disso, a SBCP argumenta que a insatisfação do paciente deve ser avaliada com base na complexidade da cirurgia e nas condições individuais de cada paciente. Isto porque fatores alheios ao procedimento, como características pessoais, condições de saúde preexistentes e expectativas irrealistas podem influenciar a percepção do sucesso ou fracasso de uma cirurgia estética.

Em alguns casos, o resultado final pode ser afetado pela resposta individual do organismo do paciente ao procedimento, como a cicatrização, que pode variar significativamente de pessoa para pessoa.

A SBCP também ressalta a importância do informed consent, ou consentimento informado, no qual o paciente deve ser completamente informado sobre os riscos, benefícios e limitações da cirurgia, bem como sobre as possíveis alternativas de tratamento.

A falta de um consentimento informado adequado pode ser considerada uma falha na prestação de serviços e, portanto, gerar responsabilidade para o médico.

Um dos grandes desafios destacados por especialistas é a forma como a harmonia ou desarmonia de um resultado cirúrgico será avaliada.

Note-se que não basta a insatisfação pessoal do paciente; é necessário buscar um consenso, o que implica em uma subjetividade que pode resultar em interpretações divergentes dentro do próprio judiciário.

A definição de "harmonia estética" é intrinsecamente subjetiva e pode variar de acordo com a cultura, a moda e as preferências individuais.

A decisão abre um precedente para que outros casos similares sejam julgados com base nessa presunção de culpa, o que poderia reconfigurar significativamente a prática da cirurgia plástica no Brasil.

Existe a preocupação de que o judiciário interfira cada vez mais em decisões técnicas médicas, desconsiderando a expertise dos profissionais de saúde.

Isso poderia levar a uma judicialização excessiva da medicina, com um aumento no número de processos contra médicos e um impacto negativo na qualidade dos serviços prestados.

Outro desafio importante é a necessidade de estabelecer critérios claros e objetivos para avaliar a responsabilidade do cirurgião plástico em casos de insatisfação do paciente.

É fundamental que o judiciário leve em consideração a complexidade da cirurgia, as condições individuais do paciente, as expectativas realistas e o cumprimento dos protocolos médicos. A simples insatisfação do paciente não deve ser suficiente para caracterizar a culpa do médico.

Outro aspecto crucial a ser considerado é o standard of care, ou padrão de cuidado, que se refere ao nível de habilidade e cuidado que um médico razoavelmente prudente e qualificado exerceria em circunstâncias semelhantes.

Para determinar se um cirurgião plástico foi negligente, é necessário avaliar se ele agiu de acordo com este padrão aceitável na época e no local em que a cirurgia foi realizada.

Isso pode envolver a análise de diretrizes clínicas, protocolos médicos e a opinião de outros especialistas na área.

A decisão do STJ sobre a presunção de culpa em cirurgias plásticas estéticas traz à tona questões fundamentais sobre a responsabilidade médica, a expectativa dos pacientes e o papel do judiciário.

É necessário um diálogo aberto entre os setores jurídico e médico para estabelecer critérios justos e equilibrados que protejam os direitos dos pacientes sem onerar excessivamente os profissionais da saúde.

Continuará a ser um tema de debate e provavelmente de ajustes à medida que mais casos forem sendo julgados sob esta nova premissa legal.

A decisão, embora alinhada a uma percepção crescente de defesa do consumidor-paciente, levanta sérias questões sobre a aplicabilidade e razoabilidade de se exigir resultados estéticos específicos, frente à complexidade e variabilidade inerentes aos procedimentos cirúrgicos.

É imperativo que o debate sobre a responsabilidade médica em cirurgias plásticas estéticas considere a importância da autonomia do paciente, do consentimento informado e da justa compensação por danos comprovados, sem, contudo, comprometer a prática médica responsável e a inovação na área.

* Natália Soriani é advogada especialista em Direito Médico e de Saúde, sócia do escritório Natália Soriani Advocacia.

Para mais informações sobre cirurgias plásticas clique aqui…

Publique seu texto em nosso site que o Google vai te achar!

Entre para o nosso grupo de notícias no WhatsApp

Todos os nossos textos são publicados também no Facebook e no X (antigo Twitter)

Quem somos

Fonte: Ex-Libris Comunicação Integrada



Imposto de Renda: quem ganha até R$5 mil realmente ficará isento?

Nova regra entra em vigor em 2026 e promete aliviar a carga tributária da classe média, mas vem acompanhada de mudanças importantes na tributação de dividendos e de altas rendas.

Autor: Divulgação


Implicações dos prazos judiciais no novo Código Civil

O regime de prazos judiciais é, indubitavelmente, um dos pilares centrais da dinâmica processual estabelecida pelo Código de Processo Civil de 2015 (Lei nº 13.105/2015).

Autor: Ellen Ketlin Machado Rocha


Isenção do IRPF: quais os benefícios e impactos?

A aprovação unânime do Projeto de Lei (PL) 1.087/2025 representa um marco histórico na política tributária brasileira.

Autor: Divulgação


Quando a estética vira dor

Entrar numa cirurgia plástica costuma ser movido por desejo de transformação. Seja corrigir um traço, recuperar a autoestima, reinventar o espelho ou até mesmo por uma condição de necessidade.

Autor: Thayan Fernando Ferreira


Trabalho temporário: direitos, limites e vantagens

Com a chegada do final do ano, época de festas, férias escolares e aumento no consumo, cresce a procura pelas empresas e lojas por trabalhadores temporários em diversos setores, como comércio, turismo, restaurantes e indústrias.

Autor: Giovanna Tawada


Fake News x Liberdade de Expressão: até onde vai o limite?

O avanço das redes sociais trouxe um dilema que desafia democracias no mundo inteiro: como equilibrar o direito fundamental à liberdade de expressão com a necessidade de combater a desinformação?

Autor: Divulgação


Banco deve indenizar cliente por furtos em conta

Criminosos levaram telefone e transferiram valores por meio de aplicativo bancário.

Autor: Divulgação


Município deve indenizar empresa por queda de árvore em imóvel

TJMG confirmou decisão da 3ª Vara dos Feitos da Fazenda Pública da Comarca de Belo Horizonte.

Autor: Divulgação


Erro de homônimo leva INSS a cancelar benefício de idoso

Casos de cancelamento indevido de benefícios previdenciários têm se multiplicado no Brasil.

Autor: Divulgação


Projeto-piloto de Secretaria unificada das Varas das Garantias em BH

A Corregedoria-Geral de Justiça de Minas Gerais (CGJ) publicou, no dia 3/09, a Portaria nº 8.547/CGJ/2025, que cria o projeto-piloto "Secretaria Unificada do Juiz das Garantias e Audiência de Custódia", na Comarca de Belo Horizonte.

Autor: Divulgação


Revisão de atividades concomitantes ainda gera erros no INSS

A revisão pode representar aumento no valor da renda mensal e até o recebimento de retroativos referentes aos últimos cinco anos.

Autor: Divulgação


STJ e a garantia tratamento contínuo de autismo nos planos de saúde

O Superior Tribunal de Justiça (STJ) deu um passo relevante na proteção dos pacientes ao firmar o entendimento de que operadoras de planos de saúde não podem rescindir unilateralmente o contrato enquanto o beneficiário estiver em tratamento médico essencial.

Autor: José Santana dos Santos Junior