Tema Repetitivo 677/STJ e as questões referentes à insegurança jurídica no cumprimento de sentença
Tema Repetitivo 677/STJ e as questões referentes à insegurança jurídica no cumprimento de sentença
Inicialmente temos que, o Processo Civil Brasileiro, após 2015, adota um modelo sincrético em seu procedimento, na qual as fases de conhecimento e execução não são vistas de forma estanque, mas sim integradas, permitindo uma maior fluidez na tramitação processual, sendo que após os trâmites processuais e a instrução probatória no processo de conhecimento, sobrevém a sentença.
Quando não há o cumprimento voluntário pela parte vencida, é necessário que haja a execução dos termos decididos, sendo que no modelo sincrético, essas fases podem se fundir em determinados contextos, permitindo que o cumprimento da sentença seja iniciado de forma mais direta, sem a necessidade de um novo processo.
O cumprimento de sentença visa garantir que a decisão do juiz tenha efeitos práticos, realizando o direito reconhecido, seja por meio de pagamento, entrega de coisa ou outra medida que se faça necessária.
Nessa toada, temos que o cumprimento de sentença, visa garantir que a decisão do juiz seja efetivamente cumprida. Nesse cenário, em termos de uma obrigação de pagar, resta a possibilidade de garantir o juízo com um depósito judicial.
Ou seja, conceito de "garantia do juízo" se revela essencial, visto que busca assegurar o cumprimento da obrigação imposta pelo Poder Judiciário, evitando que o credor tenha prejuízos no caso de inadimplemento.
A figura do depósito judicial vinha sendo tradicionalmente uma das formas mais utilizadas de garantir a execução da sentença, sendo que o depósito judicial a fim de garantir o juízo cessava toda a mora e os consectários legais da legislação.
Porém, o Tema Repetitivo 677, julgado em 2018, consolidou a tese de que o depósito em dinheiro não é mais necessário para garantir a execução da sentença, ou seja, não cessará a aplicação da mora e da correção monetária.
O cumprimento de sentença e a garantia do juízo: o contexto histórico e as mudanças no Código de Processo Civil
Antes da entrada em vigor do Código de Processo Civil de 2015, o cumprimento de sentença era um tema que gerava inúmeras controvérsias, especialmente no que tange à necessidade de garantir a execução da decisão judicial.
O Código de 1973, que vigorava até 2015, possuía uma abordagem rígida quanto à necessidade de garantir o juízo com o depósito de valores preferencialmente a fim de cessar toda e qualquer mora, para após, ser possível que o executado exercesse o seu direito de defesa, apresentando a devida impugnação, apontado de forma clara e precisa os valores que entende como devido, os vícios e erros insanáveis aos cálculos.
Ocorre que, com o julgamento do Tema Repetitivo 677, no REsp 1.348.640/RS, em 2018, representou uma alteração significativa no entendimento do STJ acerca da exigência de depósito judicial para o cumprimento de sentença, bem como para cessar a mora e os consectários legais da legislação.
Tal entendimento anterior, consagrava a estratégia de se garantir o juízo executório por meio de um depósito judicial e simultaneamente impugnar a execução, condicionando o levantamento desse depósito à decisão final acerca da impugnação, estratégia relativamente comum na prática forense, tendo em conta a difundida crença de que os consectários da mora não incidiriam mais após a garantia do juízo.
O executado depositava os valores em garantia e exercia o seu direito de defesa, protegendo-se contra eventual crescimento do débito exequendo, em razão dos juros de mora e correção monetária incidentes sobre os créditos judicializados.
A tese original, fixada em 2014, afirmava que “na fase de execução, o depósito judicial do montante (integral ou parcial) da condenação extinguia a obrigação do devedor, nos limites da quantia depositada“.
A premissa da tese fixada em 2014 era de que seria responsabilidade da instituição financeira corrigir o valor depositado ou penhorado até que ele fosse entregue ao credor, com fundamento na Súmula 179 do STJ [2], e nos artigos 629 do Código Civil, 666, I, e 1.219 do CPC/1973.
No entanto, após o CPC/2015 e as questões judiciais, o STJ, ao analisar a questão determinou que na execução, o depósito efetuado a título de garantia do juízo ou decorrente da penhora de ativos financeiros não isentaria o devedor do pagamento dos consectários de sua mora, conforme previstos no título executivo, devendo-se, quando da efetiva entrega do dinheiro ao credor, deduzir do montante final devido o saldo da conta judicial, visto que os valores depositados judicialmente são corrigidos monetariamente com porcentagens inferiores ao usualmente aplicado.
Essa mudança trouxe um impacto profundo nas relações em que a parte passiva trata-se de Instituição Financeira em razão da insegurança jurídica, sendo que o executado não se beneficia mais da segurança do depósito, que anteriormente era uma forma de assegurar que a dívida fosse quitada ou que a mora fosse suspensa.
A maior consequência dessa mudança é a insegurança jurídica gerada pela continuidade da correção monetária e dos juros durante o cumprimento da sentença de processos que tramitam a muitos anos no judiciário, onerando excessivamente o executado.
Ou seja, no contexto atual, ao não realizar mais o depósito em garantia, o executado fica sujeito a um aumento contínuo de sua dívida, já que a correção e os juros continuam a incidir sobre o valor da obrigação enquanto o processo segue.
O impacto financeiro para as instituições bancárias é extremamente significativo, pois a perda de controle sobre o depósito implica em uma maior imprevisibilidade quanto ao valor final da dívida, e como em muitos casos há a necessidade da abertura da instrução processual para a realização de perícia contábil, não há sequer segurança sobre o valor correto a ser devido antes da dilação probatória.
A modificação da tese criou um cenário de incerteza, uma vez que os débitos exequendos aumentarão ao longo do processo de cumprimento de sentença, dificultando o controle da obrigação e gerando prejuízos inesperados e uma onerosidade excessiva apenas para uma das partes.
Insegurança jurídica e preclusão de direitos no cumprimento de sentença
O Tema 677 trata sobre a natureza do depósito judicial efetuado a título de garantia do juízo ou decorrente da penhora de ativos financeiros no âmbito do cumprimento de sentença.
A decisão, ao interpretar que o depósito feito nesse contexto não isenta o devedor do pagamento dos consectários da mora (como juros, multa e atualização), trouxe um esclarecimento: embora o depósito garanta a execução da sentença, ele não elimina a responsabilidade do devedor pelos encargos de mora previstos no título executivo.
A referida questão gerou discussões sobre como a aplicação dessa interpretação pode afetar a segurança jurídica.
O executado, ao realizar um depósito judicial como forma de garantir a execução da sentença, espera que esse depósito tenha o efeito de suspender ou, ao menos, reduzir os encargos de mora, dado que o valor já estaria, em teoria, disponível para o credor. Contudo, não houve modulação de efeitos para aplicar a referida tese trazendo uma insegurança jurídica.
A insegurança jurídica gerada pela decisão no Tema 677 é ampliada pela ausência de modulação dos efeitos. A modulação de efeitos é uma ferramenta para limitar os efeitos retroativos de uma decisão, aplicando-a apenas para casos futuros ou, no máximo, para situações que ainda não tenham transitado em julgado.
No caso do Tema 677, não houve a modulação dos efeitos da decisão, o que significa que a nova interpretação sobre os depósitos judiciais e a manutenção dos encargos da mora se aplicam de forma retroativa, afetando inclusive os casos que já haviam sido concluídos com a expectativa de que o depósito resultaria na isenção dos juros de mora.
Essa ausência de modulação intensifica a insegurança jurídica, pois as partes que realizaram depósitos judiciais com base em uma interpretação anterior podem ser surpreendidas com a necessidade de adimplir com encargos e mora, elevando a execução à valores exorbitantes.
A não modulação de efeitos cria um ambiente de imprevisibilidade nas relações jurisdicionais, onde muitos profissionais do direito utilizam-se da não modulação para a finalidade de obter valores referente aos consectários da mora, correção monetária de processos em que tramitam há muitos anos no judiciário, onerando excessivamente o executado, que eventualmente será compelido a adimplir valores com os quais à época do depósito, a interpretação legislativa garantia algo que atualmente não está mais em vigor.
Além do mais, necessário mencionar que ante a não modulação dos efeitos infringe a aplicabilidade da preclusão de direitos, que também se torna um problema significativo, visto que, de certa forma e algum momento o credor concordou com os valores depositados à cargo de garantia do juízo e pleiteou o seu levantamento, porém, atualmente, mesmo após tal manifestação expressa de concordância, os profissionais do direito impulsionam os autos requerendo a aplicação do referido Tema Repetitivo ante a não modulação, prejudicando a parte executada que vinha sendo amparada pela legislação anterior.
Conclusão
O Tema Repetitivo 677 do STJ representou uma mudança relevante no tratamento da garantia do juízo no cumprimento de sentença, e a não modulação dos efeitos da decisão aplica de imediato sua nova interpretação retroativamente, o que significa que as pessoas que já haviam feito depósitos judiciais com base em uma compreensão anterior da norma — que poderia indicar que o depósito isentaria ou reduziria a cobrança dos encargos de mora — agora se veem diante de uma nova realidade jurídica, que exige o pagamento desses encargos, mesmo já tendo garantido parte do valor devido.
Isso traz imprevisibilidade e desconfiança, pois quem se utilizou de uma interpretação consolidada para garantir a execução de uma sentença se vê, de repente, sujeito a custos adicionais que não foram originalmente considerados.
Essa mudança inesperada no entendimento jurídico afeta a confiança dos cidadãos e das empresas nas decisões judiciais e pode ter repercussões econômicas significativas para aqueles que planejaram suas ações com base em uma expectativa legítima de que a execução da sentença seguiria as regras anteriormente aplicadas.
A ausência de modulação dos efeitos no Tema 677 impacta diretamente a segurança jurídica, criando um ambiente de incerteza para as partes envolvidas no cumprimento de sentença.
Ao aplicar a decisão de forma retroativa, prejudicando a confiança nas decisões judiciais, a estabilidade das relações processuais e a efetividade do cumprimento de sentença.
A modulação de efeitos, ao limitar os impactos retroativos de mudanças interpretativas, seria uma medida importante para preservar a segurança jurídica e evitar que os direitos adquiridos fossem afetados de maneira abrupta, garantindo maior previsibilidade e estabilidade no ordenamento jurídico.
* Leticia Moreno é advogada sob a OAB/SP nº 468.415, formada pelo Instituto Toledo de Ensino.
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Fonte: Andressa Ferraz


